Tudo começou com a rapaguaça (Parte I)

Foi amor à primeira vista...

No pau-de-arara que o traria a São Paulo, o menino-molusco estava impaciente. Apertado entre outros tantos retirantes, não sossegava. Insistia em perguntar à sua mãe analfabeta de nascença quando chegariam ao seu destino. Quando a matriarca lhe dizia que ainda iria demorar, chorava de birra. Começou a incomodar os companheiros de jornada. Um deles teve uma brilhante idéia: deu ao calanguinho um copo de cachaça e um naco de rapadura. Disse-lhe: "Batraquinho, vai molhando esse docinho nesta aguinha que passarinho não bebe e chupando até acabar. Assim, a viagem passa mais rápido!

O então inocente apedeuta resolveu experimentar... e gostou tanto que, para acalmarem-lhe os ânimos, os incomodados retirantes o supriram com mais e mais "rapaguaça". Enfim, dormiu...

Acordou na cidade grande. Mas na metrópole, não havia roça, não havia comida. Precisava trabalhar. Resolveu ser operário. Logo, arrumou emprego, mas... que preguiça! Encontrou, então, a solução perfeita: no almoço, tomava uns golões de Domecq para animar-se para o segundo turno na fábrica.

A tática funcionou por uns tempos, mas, no fim, a preguiça voltou a reinar. Nosso Macunaíma da vida real precisava de um novo plano. Depois de muito refletir em uma mesa de bar, encontrou uma brilhante solução: vou me aposentar por invalidez! Tomarei todas pra criar coragem e não sentir dor e oferecerei meu dedinho em sacrifício ao marvado torno. Foi o que fez...


A vida começava, finalmente, a lhe sorrir. Um pequeno sacrifício por um grande benefício! Mas, faltava algo em sua vida. Pensava, à epoca, o sapinho de barba rala: "tenho tantas idéias, preciso propagá-las" (nota do autor: não foram estas as palavras literais de nosso herói, pois era vocabulário demais para ele).

Pensou... bebeu... bebeu... pensou e, em um momento de epifania alcoólica, veio-lhe a luz: "vou me tornar um sindicalista"! (Continua...)